"Queria, inicialmente, manifestar o quanto nos honra e nos orgulha a presença de convidados tão ilustres, o que confere representatividade ímpar a esta solenidade.

Minhas primeiras palavras não poderiam deixar de ser de agradecimento aos nobres conselheiros deste tribunal, que me honraram com sua confiança, elegendo-me presidente, ao lado do vice-presidente Antonio Honorato e do corregedor, conselheiro Filemon Matos, para o biênio 2004/2005, cargo que vinha exercendo desde setembro de 2002, quando sucedi o conselheiro Adhemar Bento Gomes, que se afastou voluntariamente, antecipando-se à aposentadoria compulsória que atinge os que completam 70 anos de idade. Desse modo, entendo minha atual investidura como prova também de reconhecimento pelo trabalho que desde então vimos desenvolvendo conjuntamente com a mesa diretora do mandato que ora se encerra, ao lado do conselheiro Antonio Honorato e do conselheiro Pedro Lino.

A confiança e o reconhecimento atribuídos a mim aumentam minhas responsabilidades e fortalecem meu ânimo para comandar esta instituição, diante dos grandes desafios que temos pela frente.

Tendo exercido minha vida profissional prioritariamente no serviço público, seja no Executivo, como diretor de empresa pública, secretário de Estado e prefeito de Salvador, e no Legislativo, como deputado federal durante 14 anos, em quatro mandados consecutivos, considero uma oportunidade rara que esta vida pública atinja seu apogeu no exercício da função de conselheiro do Tribunal de Contas, com atribuições bastante diferenciadas das anteriores, mas de igual relevância para a sociedade e de importância decisiva para a própria existência do estado democrático de direito e para a governabilidade.

Os Tribunais de Contas e seu novo papel social

Esta é uma experiência que se enriquece e fortalece quando consideramos que as atividades de controle externo e a rede de tribunais de Contas que existem para cumprir esta função constitucional vivem um momento histórico sem precedentes. Trata-se de um processo cujas dimensão e profundidade envolvem, sem dúvida, o Estado brasileiro como um todo e no qual o Tribunal de Contas do Estado da Bahia está totalmente envolvido.

Refiro-me a um quadro que se inicia com o processo de redemocratização do país, que tem como marco referencial a eleição, em 1985, ainda pelo sistema do voto indireto, do presidente Tancredo Neves, seguida pela criação da Assembléia Nacional Constituinte, entre os anos de 1987 e 1988.

A nova Constituição, que assinala a normalização do estado democrático de direito, confere às atividades de controle externo, ou seja, aos tribunais de Contas atribuições que levam os mais conceituados juristas, cientistas políticos e mestres do Direito Constitucional a reconhecer essas instituições como órgãos autônomos e independentes em relação aos três poderes clássicos dos regimes republicanos: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Esta é a visão do doutor em Direito Constitucional, Carlos Ayres de Brito, ministro do Supremo Tribunal Federal, e também do professor e consultor Diogo de Figueiredo Moreira Neto. São, pois, os tribunais de Contas instrumentos efetivos do controle social.

Democracia, controle e governabilidade

Este processo reflete a própria evolução do regime representativo das sociedades contemporâneas nas quais a democracia formal se transforma, irreversivelmente, em democracia substantiva, fortalecendo o controle externo, um dos seus pilares de sustentação.

Sim, porque neste modelo mais evoluído de democracia a participação dos cidadãos não está restrita apenas à escolha dos governantes. A sociedade quer também acompanhar como está sendo governada e cobrar dos governantes os resultados de suas ações, em função dos compromissos assumidos e que levaram à sua escolha. Neste contexto, a função do controle externo se torna mais abrangente e ambiciosa.

Manifestando-se a este respeito, Carlos Estevam Martins, doutor em Ciências Sociais e professor da USP, afirma que “governar é uma atividade complexa que envolve, no mínimo, quatro componentes: dirigir, planejar, organizar e controlar”. Entre estes componentes essenciais à governabilidade, o exercício do controle sofre o preconceito de ser – equivocadamente – associado a “cerceamento, censura, opressão”. Para ele, a atividade de controle “(...) é um aspecto fundamental da vida do Estado e da sociedade. Onde quer que haja objetivos a serem alcançados, padrões a serem respeitados, regras a serem obedecidas, condições a serem satisfeitas; onde quer, enfim, que haja interação civilizada existe a necessidade de um fluxo permanente e sistemático de operações de controle. Se essa necessidade não é atendida, temos o descontrole e, conseqüentemente, torna-se baixo o grau de governabilidade”.

Controle social, conquista democrática

Assim, as próprias exigências da sociedade têm levado os tribunais de Contas a ampliar as atribuições e os objetivos de seu trabalho. Não basta mais apenas avaliar a aplicação dos recursos públicos pela ótica da legalidade – a este elemento, que é premissa essencial, foram acrescentados parâmetros de eficácia, eficiência e efetividade.

É preciso, portanto, além do cumprimento das leis que regem a aplicação dos recursos públicos, aferir sua eficácia e eficiência, isto é, verificar se os resultados obtidos estão de acordo com os objetivos planejados e se o foram dentro da melhor relação custo-benefício, e, mais ainda, se o impacto produzido pela ação dos governantes alcançou resultados relevantes para a sociedade.

Em nosso país, este processo tem sido marcado por conquistas nos instrumentos legais que regem a administração pública e também por acontecimentos na vida política e social que, embora muitas vezes traumáticos, assinalam posturas novas e altamente positivas da sociedade: a rejeição à impunidade e a compreensão de que a nenhum poder ou governante está franqueado o direito de agir acima ou contrariamente à lei.

Como exemplos, citamos a Lei Orçamentária, a elaboração dos planos plurianuais (PPAs), que obrigam os governantes a projetar planos de longo prazo, estabelecer objetivos, prioridades e metas que orientam a aplicação dos recursos e a efetivação de projetos e programas, possibilitando uma avaliação mais efetiva de sua execução e resultados. Cumpre aqui destacar o avanço representado pela aprovação, no ano 2000, da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

No âmbito do processo político, o acontecimento mais importante foi o impeachment do presidente Fernando Collor, em 1992, além do desmascaramento e a perda de mandatos de deputados que manipulavam de maneira criminosa o orçamento da União, e a CPI do Judiciário, que revelou em anos mais recentes que as irregularidades e os crimes contra o erário não seriam suportados em qualquer instância dos poderes da República.

O Tribunal de Contas da Bahia: experiência e articulação

Para fazer frente a suas novas atribuições e corresponder às expectativas crescentes da sociedade, os tribunais de Contas passam por um processo de modernização e transformação em todo o país. Vale ressaltar que o Tribunal de Contas do Estado da Bahia, pela qualificação e competência de seu corpo técnico, é historicamente um dos mais avançados e experientes do Brasil na aplicação de modernas técnicas auditoriais, sendo, junto com o Tribunal de Contas do Estado do Paraná e, mais recentemente, o Tribunal de Santa Catarina, credenciado para auditar programas governamentais co-financiados pelo Banco Mundial (Bird) e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

No âmbito da cooperação e das ações em parceria, destacamos que a nossa experiência parlamentar no Congresso Nacional auxilia e fortalece a intensa atividade de intercâmbio do TCE da Bahia com todo o sistema nacional de controle externo: com o Tribunal de Contas da União, com a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), com o Instituto Ruy Barbosa e com os congêneres tribunais estaduais e municipais. Uma atividade que fez com que a Bahia tivesse papel destacado na efetivação de programas de grande alcance.

Refiro-me ao Programa de Modernização do Sistema de Controle Externo Estadual e Municipal (Promoex), uma iniciativa do Ministério do Planejamento e Orçamento, com apoio do BID e que visa modernizar e fortalecer institucionalmente o sistema de controle externo no âmbito dos estados e municípios, garantindo a sua integração nacional e aumentando a eficiência e eficácia das ações de fiscalização e controle, com a finalidade de contribuir para a efetiva e regular aplicação dos recursos públicos estaduais e municipais em benefício da sociedade.

Igualmente importante é o Projeto de Aperfeiçoamento do Controle Externo com Foco na Redução da Desigualdade Social (Cerds), realizado em parceria com o Tribunal de Contas da União, com o Tribunal do Estado de Pernambuco e o Reino Unido. Este projeto tem por objetivos o desenvolvimento de conceitos, técnicas e metodologias para a avaliação de programas governamentais e a utilização dos resultados por órgãos e instituições, de forma a contribuir para a análise e monitoramento do impacto das ações de governo sobre as desigualdades sociais.

No campo da cooperação internacional, o TCE da Bahia celebrou há pouco mais de 10 anos o Protocolo de Cooperação Técnica com o Tribunal de Contas de Portugal, visando a troca permanente de experiências e conhecimentos. Esta iniciativa, pioneira entre os tribunais de Contas dos estados e municípios, tem apresentado resultados bastante positivos, justificando sua renovação há pouco menos de um ano.

Por outro lado, nossa formação democrática, o exercício de uma gestão participativa e a consciência de que o êxito de nosso trabalho requer uma postura de entendimento e cooperação com todos os entes do poder público nos levam a manter um relacionamento de alto nível com o Governo do Estado, com o Judiciário, o Ministério Público e, particularmente, com a Assembléia Legislativa. Neste caso, porque nos cabe a atribuição de auxiliar o Legislativo no cumprimento de sua função constitucional de exercer o controle externo sobre o Executivo.

Cabe aqui registrar que nosso relacionamento com o Executivo é facilitado pela postura do governador Paulo Souto, que, com obras como a criação do SAC, em seu primeiro mandato, e, no atual, a criação da Ouvidoria Geral do Estado, assim como no exercício do seu mandato de senador, quando foi relator da CPI do Judiciário, demonstra ter uma visão democrática avançada, inteiramente afinada com os princípios que sustentam a autonomia e a independência dos poderes no regime republicano e com a valorização da cidadania.

Modernização

No âmbito interno do TCE da Bahia, é nosso dever assinalar o trabalho desencadeado pelo meu antecessor na presidência, o conselheiro Adhemar Bento Gomes, a partir do ano 2000, que propôs um projeto ambicioso de modernização fortemente apoiado na tecnologia da informação e na implantação de modernos instrumentos de processamento de dados e de gestão administrativa. Este projeto, que me coube acelerar e aprofundar, registra realizações importantes, a exemplo da instalação do Comitê de Auditoria, da Auditoria Interna, a implantação do Sistema de Avaliação de Desempenho e a implementação de uma política sistemática de comunicação institucional. O recebimento de prestação de contas por meio eletrônico e o novo modelo de avaliação conjunta de contas dos jurisdicionados são dois avanços importantes nesta direção.

Este processo tem como marco evolutivo a mobilização de todo o corpo funcional do TCE para o processo de planejamento estratégico, que resultou na elaboração do plano para o período 2004/2007, um instrumento que vai orientar a ação do tribunal, que se desdobra na elaboração de planos anuais, com a fixação de objetivos, prioridades, diretrizes e metas abrangendo a instituição, em seu conjunto, e cada um dos seus setores, em particular.

Para cumprir satisfatoriamente suas novas atribuições, o TCE tem investido de forma sistemática na qualificação e aperfeiçoamento do seu quadro funcional. Destaque para o apoio à realização de cursos de pós-graduação, em nível de especialização, mestrado e doutorado. Para preservar e difundir trabalhos acadêmicos de alto nível, criamos, recentemente, um selo editorial, cujo nome homenageia o ilustre tributarista baiano Aliomar Baleeiro. Os prêmios Osvaldo Veloso Gordilho e Renan Baleeiro, por sua vez, são mecanismos adicionais de estímulo ao aperfeiçoamento profissional de nossos técnicos.

No exercício pleno de suas novas e mais abrangentes funções, o TCE tem consciência de que mais importante do que o efeito punitivo do resultado de seus trabalhos é a ação preventiva, que, além de inibir os maus gestores, os que cometem irregularidades com a intenção deliberada de lesar os cofres públicos, oferece orientação, em função dos parâmetros a partir dos quais suas ações serão avaliadas para que os gestores atuem de maneira correta.

Esta nova postura nos levou à realização, em novembro passado, do 1º Fórum de Controle do Estado da Bahia, quando conselheiros, auditores e técnicos do TCE se reuniram com representantes dos órgãos jurisdicionados para debater as questões relativas aos seus interesses, aprofundando uma perspectiva de diálogo e de interlocução. A iniciativa sem precedentes inaugura um novo modelo de atuação no qual saem ganhando a transparência e a correta aplicação dos recursos públicos.

Novos horizontes

Minhas senhoras, meus senhores,

A conquista da democracia exige um novo padrão de deliberação que considere o cidadão como foco da ação política. Pela experiência que estamos vivendo de consolidação do estado democrático de direito em nosso país e a conseqüente ampliação da importância e do valor social do controle externo, pelo processo de modernização que o TCE vive para fazer face à ampliação das suas atribuições, pelos êxitos que alcançamos no primeiro mandato, tenho certeza que criamos as bases para que esta instituição evolua para um novo ciclo em sua história, marcado por níveis crescentes de eficiência no cumprimento de sua relevante missão social.

Como assinalei anteriormente, temos como elemento norteador de nossas ações no próximo biênio o planejamento estratégico, elaborado de forma participativa, implicando, portanto, no comprometimento de todos os servidores desta casa. Afinados com os princípios norteadores deste planejamento, propomos um novo projeto de gestão para o Tribunal de Contas da Bahia fundamentado nos balizamentos macroinstitucionais, em torno da qualidade e do fortalecimento do Estado e sob a perspectiva microinstitucional, na busca da modelagem e fortalecimento das instituições que o constituem, melhorando seu desempenho em benefício do cidadão.

Conscientes de que a busca pela eqüidade social e o combate à corrupção se dão através da intervenção sobre suas causas estruturais e institucionais, propomos um projeto de gestão participativa para o TCE da Bahia alicerçado sobre as seguintes premissas:

  • Diferenciação e complementaridade entre as funções do Estado, do mercado e da sociedade civil organizada (integração entre Estado e sociedade).
  • Crescente responsabilização social da atuação dos órgãos de controle externo (responsabilidade compartilhada).
  • Ética no trabalho, transparência e administração participativa (política de comunicação institucional).
  • Integração interinstitucional e fortalecimento do sistema de controle externo da administração pública (rede de relações).
  • Visão integradora e de incentivo ao compartilhamento dos problemas e soluções (visão dos TCs enquanto sistema integrado).

É a partir do referencial estabelecido por estas premissas que serão traçados os principais projetos desta gestão. Estes projetos buscarão:

  • Implantar um modelo de administração participativa que privilegie a cooperação mútua, a liderança, a autonomia e a responsabilidade.
  • Valorizar o capital humano e social da instituição através do desenvolvimento de lideranças e competências individuais e institucionais (gestão do conhecimento e gestão de pessoas).
  • Estimular a cooperação e a participação através do estabelecimento de uma rede de relacionamento horizontal e flexível com o ambiente interno e externo da instituição (política de comunicação institucional e parcerias interinstitucionais).
  • Implantar uma política de capacitação permanente de pessoal (educação continuada, universidade corporativa ou outro modelo especializado).
  • Aprimorar o uso das tecnologias da comunicação e da informação nas atividades auditoriais, administrativas e de capacitação, com o desenvolvimento de pesquisa, de estudos de novas metodologias e de consolidação de parcerias internas e externas (aproximação com outros tribunais de Contas, instituições de ensino superior e outros países).
  • Redimensionar a estrutura administrativo-organizacional da instituição (modernização organizacional e ampliação das atividades do Cedasc).

Ilustres autoridades, queridos amigos e familiares,

Permitam-me abrir um parêntese neste pronunciamento estruturado, organizado e, como sempre, muito sincero, mas predominantemente racional, para em alguns poucos minutos expressar de forma mais livre as emoções e os sentimentos que me dominam neste instante.

Numa noite de segunda-feira, nos idos de maio do ano de 2000, no aeroporto de Cumbica, São Paulo, aguardava o embarque com destino a Montevidéu, onde ia participar de um evento sobre A Mídia e a Democracia. Fiz uma ligação telefônica para o senador Antonio Carlos Magalhães sobre assuntos corriqueiros.

Na conversa, ele externou o desejo do seu grupo político de me indicar para o TCE. Tomei um susto tão grande que silenciei, ao ponto do senador julgar ter caído a ligação.

A partir daquele instante, e por mais 30 dias, voltei a viver intensamente momentos de angústia e ansiedade, presentes em momentos de decisão pessoal significativa para mim e para minha família, que sempre se constituiu em um marco referencial em minha vida.

Em 1964, troquei a carreira bancária pelo serviço público. Em 1967, deixei o recém-criado Desenbanco para atuar em empresas de consultoria econômica.

Em 1969, retornei à área pública através do ingresso no Baneb.

Em 1971, mereci do então governador Antonio Carlos Magalhães o convite para dirigir a Bahiatursa, o que me permitiu fazer uma ligação efetiva entre a teoria e a prática, entre o projeto e a realidade, desafiar crenças e preconceitos, ajudando ao eminente governador, primeiro homem público de expressão política nacional, a transformar o turismo em instrumento de política de desenvolvimento econômico e cultural no nosso Brasil.

Em 1975, vivi a experiência, também inesquecível, de conviver no Grupo Odebrecht. Em 1979, novamente pelas mãos do governador Antonio Carlos Magalhães, no seu segundo mandato, assumi a Secretaria da Indústria e Comércio, onde tive a experiência mais sistêmica da minha carreira profissional.

Em 1983, vivi a fascinante, honrosa e, certamente, a mais destacada missão de governar a minha querida Salvador.

Em 1986, a eleição para representar a Bahia na Assembléia Nacional Constituinte decorreu de uma deliberação pessoal que se tornou realidade pelo apoio e reconhecimento de cerca de 30 mil baianos, entre os quais muitos que aqui se encontram.

Seguiram-se 14 anos de vida parlamentar, conquistada com luta, determinação, vontade pessoal e, claro, muito claro, a ajuda de tantos, aos quais dedico meu pleito de gratidão e reconhecimento.

E se fiz este histórico, tão prolixo como costumo ser com freqüência, foi para justificar o elevado preço emocional da decisão de aceitar o convite para integrar, como faço hoje, a honrosa e significante função de conselheiro do Tribunal de Contas da Bahia. Mais uma vez, renovo os agradecimentos ao ex-governador César Borges e aos deputados da Assembléia Legislativa pela indicação e aprovação do meu nome.

Não foi apenas difícil. Foi uma decisão sofrida, muito sofrida, para a minha personalidade, neuroticamente responsável, como classificou certa vez um fraternal amigo.

Recebi muitas críticas de amigos, eleitores e até mesmo de adversários políticos, que mesmo na condição de adversários valorizavam o respeito à minha atuação. Muitas destas críticas, feitas de forma explícita e às vezes agressiva, outras disfarçadamente, acusavam-me, cobravam-me, do que consideravam um ato de acomodação. Mas, justiça se faça, também foram muitos os que compreenderam, me ajudaram e me apoiaram.

Agora, quero me dirigir a todos, sem distinção, agradecendo estímulos e as críticas recebidas, pois tanto umas como as outras foram fundamentais para a compreensão da realidade dos tribunais de Contas.

Assim, entendi claramente algo que posso exprimir numa frase que escolhi para minha mensagem de Natal e de Boas Festas: “Onde a vida nos colocou é nosso lugar de agir e aí fazer nosso horizonte de realização visando a eternidade da vida”.

Transformei as dúvidas e incertezas em convicção, em esperança e em confiança inabaláveis de que a função de controle não é restrita aos tribunais de Contas e auditorias, mas sim uma missão da coletividade, que pode e que deve ser, sobretudo, um instrumento colocado à disposição da sociedade para o fortalecimento da democracia e da busca por maior justiça social.

Esta é a nossa luta no Tribunal de Contas da Bahia, no Tribunal de Contas da União, que lidera a efetiva implantação de um sistema nacional de tribunais de Contas, da Atricon, do Instituto Ruy Barbosa e de todos os tribunais de Contas do país.

Entendo que devia essa satisfação pública, e Deus me proporcionou nesta solenidade tão representativa a oportunidade de afirmar às autoridades constituídas, aos amigos, aos familiares, à minha Nena, aos meus filhos, netos e irmãs, que continuo tentando com trabalho, esforço, determinação, muitas vezes de forma tensa e carrancuda, mas sempre com alegria e felicidade, retribuir tudo de bom que tenho recebido de vocês.

Neste momento histórico em que as instituições encarregadas do controle externo passam por mudanças sem precedentes, quero encerrar minhas palavras evocando uma figura e um exemplo que nos remete ao começo de toda esta história. Se a idéia da criação de uma instituição como o Tribunal de Contas, no momento mesmo em que se fundava a República, deve-se à visão lúcida e avançada do baiano Ruy Barbosa, sua implantação e fortalecimento são produto de um brasileiro de grande envergadura e projeção em nossa história. Refiro-me ao paraense Inocêncio Serzedello Correa. Ardoroso abolicionista e combatente republicano, notabilizou-se pelo brilho e extraordinária competência com que desempenhou funções as mais diversas, de alto risco e responsabilidade nos primeiros anos da República. Foi governador do Paraná, cargo que acumulou com o de comandante das Armas. Em seguida, foi nomeado ministro das Relações Exteriores, pasta que acumula com a da Justiça e do Interior. Meses depois, assume o Ministério da Agricultura, que acumula com o da Fazenda, cargo que passa a exercer com exclusividade e onde protagonizou o episódio mais marcante de sua valorosa vida pública.

Como ministro da Fazenda, implantou e conduziu a instalação do Tribunal de Contas, instituição autônoma e independente na missão de fiscalizar as contas públicas. Logo depois da sua instalação, o tribunal considerou ilegal uma nomeação feita pelo presidente Floriano Peixoto. Inconformado, o marechal- presidente, através de decretos, retirou do tribunal a competência para impugnar atos considerados ilegais.

Não concordando com a posição do presidente, Serzedello se demitiu do ministério, assumindo as conseqüências de seu ato de bravura. Sua carta de demissão é peça importante daquele momento histórico.

Mais do que as mais avançadas tecnologias são atitudes como esta que fazem a força e a perenidade das instituições. E é o seu exemplo de coragem, de coerência, de integridade e de fidelidade a seus princípios e valores que invoco aqui, agora, ao assumir este mandato.

Muito obrigado."