Aprovado com alguns avanços em relação ao seu antecessor, o novo Fundo para a Educação Básica (Fundeb) corre sério risco de desaparecer do mapa caso progridam as intenções de operar a desvinculação das receitas orçamentárias prevista na Constituição Federal de 1988. O prognóstico foi feito pelo mestre e doutorando em Educação na UFPE, Paulo Rubem Ferreira, nesta quarta-feira (16.06), durante a 2ª edição online do programa Jornadas Técnicas de 2021.
Apesar da participação da União se ampliar até 23,5%, em 2026, com três modalidades e valores de transferências do Fundo, o palestrante afirmou que o sistema de fundos, amparado na subvinculação das vinculações constitucionais, transformou-se numa armadilha, arrastando as comunidades educacionais para a disputa da menor parte das riquezas que o país tem sido capaz de produzir.
A apresentação do tema “Novo Fundeb, EC 108/2020 e Distribuição de Recursos para Educação” teve a mediação da assessora jurídica do Gabinete da Conselheira Carolina Costa, Mariana Coutinho, que fez um resumo do currículo do professor Paulo Rubem Ferreira e ressaltou que é muito importante a compreensão dos aspectos macroeconômicos que podem impactar na política pública educacional, principalmente em contextos de crise e de queda de arrecadação de impostos que compõem o Fundeb.
“Faz-se necessário conciliar as políticas tributária e fiscal com as prioridades sociais e a transparência se torna fundamental para o alcance desse objetivo. A Emenda Constitucional nº 108/2020 tornou o Fundo permanente e trouxe normas que ainda precisam de melhor regulamentação. Por isso é importante que os Tribunais de Contas se mantenham atualizados e capacitados para o exercício da fiscalização conforme as novas disposições constitucionais”, disse Mariana Coutinho.
Em seguida, o palestrante foi enfático ao afirmar que o novo Fundeb traz e amplia os mesmos percalços do Fundo anterior, em especial por estabelecer três mecanismos de complementação de recursos cuja normatização se apresenta complexa, confusa e de difícil compreensão para os não especialistas. “Considero ainda a Lei de Regulamentação da Emenda 108 mal elaborada, com idas e vindas a inúmeros de seus artigos, pouco clara, fruto de um projeto que não nasce de um Custo-Aluno qualidade previamente estabelecido”, pontuou Paulo Rubem Ferreira.
Para justificar sua afirmação de que o Fundeb está ameaçado, o palestrante argumentou que, desde 2000, com a Lei Complementar 101, o Brasil está submetido à supremacia dos dispêndios com a dívida pública na execução dos gastos públicos. “Ainda assim a dívida nunca parou de crescer, exigindo mais e mais sacrifícios não-financeiros, seja para o pagamento de juros ou de amortizações, além de exigir refinanciamentos anuais da parcela do estoque não paga no ano de vencimento”. Ainda de acordo com Paulo Rubem Ferreira, os números e percentuais em relação ao PIB apontam que, há décadas, a dívida deixou de ser instrumento de cofinanciamento do estado, passando o Estado a ser o financiador em última instância da acumulação do capital, ancorado nas operações com títulos do Tesouro Nacional.
Não será possível compreender com clareza, segundo o palestrante, a vinculação e os valores a um percentual de um orçamento quando o mesmo não é conhecido nem adequadamente acompanhado em sua elaboração e execução. “Imaginemos então compreender a subvinculação de uma vinculação pouco conhecida, sobretudo quando a referida subvinculação e a complementação da União relacionam-se a duas ordens de grandeza em termos de arrecadação (Valor Aluno Ano-VAAF - pertinente aos recursos transferidos ao Fundeb e Valor Aluno Ano Total, VAAT, relativo aos recursos totais da arrecadação mínima, relativos ao artigo 212 da Constituição Federal”.
Em sua explanação, o especialista argumentou que não foi possível consolidar uma estratégia adequada e sólida de atuação dos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social, além de não haver investimentos na formação dos conselheiros, com a precarização da atuação dos Conselhos de Acompanhamento. “As fraudes na aplicação dos recursos oriundos do Fundo se agigantaram, colocando-se na dianteira da má utilização dos recursos transferidos pela União para o cofinanciamento das políticas sociais pelos estados, Distrito Federal e municípios. Os inúmeros relatórios de auditorias da CGU acerca do assunto comprovam essa situação”, ressaltou Paulo Rubem Ferreira.
O palestrante concluiu afirmando que, sob ameaça de ver desmoronar, por determinação da PEC 188/2019, o sistema de vinculação de recursos para a educação, âncora das subvinculações vigentes, o novo Fundeb, não nos bastassem as fragilidades da fiscalização e do controle social relativas ao período de vigência de sua versão anterior, terá caminhos árduos para sobreviver e consolidar suas proposições quanto ao reforço das transferências da União para a educação básica no país até 2026.
Confira aqui a íntegra da palestra.